Quem somos

sexta-feira, 23 de junho de 2017

A noite de S. João



Esta noite  festeja-se o S. João, que tão boas recordações de infância me traz. 
Este ano, muito sensatamente, foi proibído o lançamento de balões, pelos motivos óbvios, mas no passado essa tradição cumpria-se sempre e não tenho memória de algum dia ter havido incêndios provocados pelos balões, pelo menosna zona onde eu vivia.

Depois do Natal, acho que esta seria, talvez para mim, a data mais excitante do calendário. Durante o dia vivíamos uma grande azáfama: recolhíamos material de queima para a fogueira, recortávamos bandeiras em papel de seda de várias cores e fazíamos cola com farinha e água, que depois espalhávamos com um pauzinho no topo de cada bandeira, para as enfileirarmos finalmente, em muitos metros de guita. Em seguida, com a ajuda de um escadote e de alguém adulto, prendíamos as extremidades dos cordéis aos ramos das árvores  e a pregos que tinham sido estrategicamente espetados nas paredes e que ficavam de uns anos para os outros.
Era assim, que o “largo” do jardim, em frente da garagem, se engalanava para a festa do S.João.
Algures, longe da vista e do alcance dos mais novos guardava-se o fogo-de-artifício que os meus pais tinham comprado uns dias antes em Lisboa, numa loja que ainda hoje existe, na Travessa Nova de S. Domingos.
O fogo-de-artifício e, claro, um enorme balão – objecto fascinante, mágico, cheio de mistério, pelo destino que lhe reservávamos de rumar ao desconhecido. A minha pouca idade levava-me a pensar que o balão seria uma espécie de embaixador, que nessa noite iriamos enviar para distantes paragens, mas nunca partilhei estes pensamentos com ninguém (aqui, ninguém, seriam os meus irmãos). No fundo, talvez me sentisse na dúvida, sem saber se tal facto era uma evidência indiscutível ou se as minhas convicções não tinham qualquer fundamento. Se assim fosse, passaria então a ser o alvo da troça dum bando de garotos insuportáveis e ainda por cima mais velhos, durante um período de tempo indeterminado.
À distância de muitos anos, ainda hoje me recordo da agitação interior que me assaltava ao  longo do dia – andava num frenesim. Toda a família e vizinhos participavam na festa. Até as tias velhinhas e a avó assistiam, muito cautelosas, sentadas lado a lado, ao abrigo da parede da casa e a uma distância razoável da confusão, não fosse saltar alguma faúlha tresmalhada do feixe das labaredas ou rebentar algum foguete, que as pusesse em perigo.
Depois do jantar, ainda de dia, ligava-se o rádio ou o gira discos com o som suficientemente alto, para que a vizinhança percebesse que se tinha dado início aos festejos. Entretanto, algum adulto acendia a fogueira e o grupo ia engrossando. Saltava-se então por cima das labaredas – os rapazes, com pulos arriscados e exibicionistas, nós, as meninas, circulando mais pelas laterais, com pinotes desajeitados e disfarçadamente batoteiros.
Os jovens - as moçoilas e os mancebos - aproveitavam geralmente para dar o seu pé de dança, já que na aldeia eram escassas as oportunidades de estabelecerem um contacto físico mais próximo, sem que dezenas de velhas lhes saltassem em cima.
Lembro-me que as raparigas também queimavam alcachofras, que depois de pernoitarem ao relento, eram devidamente inspeccionadas para se verificar se haviam florescido de novo e qual o grau de esperança que cada jovem casadoira podia ter quanto ao seu futuro amoroso.
Num dos anos, até houve sessão de cinema.
O Sr. Joaquim Latoeiro, homem bonacheirão e vermelhusco, que vivia na mesma rua mas um pouco acima da nossa casa, possuidor de uma moto a que chamávamos Cocciolo – presumo que seria o nome do seu inventor -, comprada em 4ª mão, no mínimo, e que emitia roncos inigualáveis todo o santo dia estrada acima, estrada abaixo, apareceu de surpresa, com uma máquina de projectar filmes, fruto de um negócio de êxito duvidoso, como era seu costume.
Esta máquina tinha uma particularidade, só ostentava uma bobina, onde a película estava enrolada, de modo que o filme ía rodando, aos solavancos, com a ajuda vigorosa dos seus golpes de manivela, para depois se precipitar dentro de um cesto que alguém providenciara para o efeito.
O Joaquim Latoeiro apareceu impante, com a sua engenhoca e logo ali, na nossa garagem, se improvisou uma sala de cinema. O meu irmão, que na altura nem sequer ainda andava no liceu, mas já sabia conduzir, tirou o Renault Joaninha cá para fora. Penduraram um lençol na parede, alinharam cadeiras e bancos numa plateia improvisada e lá passámos parte do serão a ver o Charlot, o Bucha e o Estica, o Buster Keaton. Um fartote de riso!
Foi uma verdadeira noite cinéfila, melhor do que as idas às matinées da FNAT e, no fim do serão, o Joaquim Latoeiro levou para casa, não um vulgar cesto, mas um poceiro da vindima, uma coisa gigantesca, cheia de metros de película toda emaranhada. Ainda hoje estou para perceber se o pobre homem alguma vez conseguiu rebobinar aquelas preciosidades. Mas o certo é que ia feliz.
Aliás, desconfio que este curioso personagem se regozijava com pequenos prazeres, momentos únicos, mesmo que fugazes,  preocupando-se mais com o presente do que com  o futuro, apesar de andar sempre falido. Tinha uma bigodaça loira, farfalhuda e uma tonalidade nas faces que não deixava dúvidas quanto ao seu gosto pelo tintol. Tenho ideia de que a mulher era uma criatura sofrida, na altura eu não entendia bem porquê, pois se o homem era tão divertido, sempre cheio de ideias geniais! E além disso ela tinha a sorte de poder andar sempre que quisesse num Cocciolo, coisa de que eu sentia imensa inveja, confesso.
O fim da noite de S.João culminava, invariavelmente com o lançamento de um balão. Esta tarefa era um ritual que se revestia de grande solenidade e a “sacerdotisa” era a minha mãe, acolitada pelo Sr. José Ramos, empregado do meu tio e seu companheiro de caça e dos jogos de lerpa.
Eu era tão pequena, mas tão pequena, que achava que deitar um balão exigia requisitos especiais. A tarefa tinha de ser executada, por um lado,  por alguém especialmente dotado, neste caso a minha mãe e, simultaneamente, por um ajudante devidamente preparado para tarefas especializadas, como matar porcos (era o Sr. José Ramos que também matava o porco em casa do meu tio). Não percebia bem era a ligação entre uma coisa e outra, mas estava certa que lançar balões e matar porcos exigiam um tipo de perícia que se enquadrava no mesmo plano.
Por exemplo, o meu pai nem tocava no balão, acho que estava proibido, não sei bem porquê!? Talvez isso se devesse a uma outra história, quando nos prometeu fazer um papagaio e, depois de vários dias a construí-lo com grande entusiasmo, explicações teóricas várias e alusões históricas, onde decerto não faltaram referências a Ícaro, coisas que a gente não dominava muito bem, o lançou direito aos fios da electricidade da rede pública, onde ficou preso durante anos, a desafiar-nos com a sua cor amarelo berrante.
Mas voltemos ao balão.
Ainda parece que estou a ver a minha mãe, muito ágil, a subir a um escadote, segurando o balão com delicadeza, enquanto o ajudante, igualmente empoleirado, segurava também aquele objecto grande, redondo, quase etéreo.
O grande problema era a mecha, a perigosa mecha que nunca se podia aproximar da fina parede do balão, sob pena de o queimar logo ali. Havia uns segundos de grande suspense, tudo mergulhado num profundo silêncio, momentos em que o grau de precisão tinha de ser absoluto.
Finalmente, o balão enchia-se de ar quente e lá se elevava nos céus, no meio de grandes exclamações de regozijo e então eu sentia ao mesmo tempo uma alegria imensa pelo sucesso da empreitada mas também sentia pena. Pena por ver o balão a desaparecer na escuridão da noite, por achar que algo que fazia parte de nós se desprendia, partia para longe – uma espécie de balão humanizado, digamos. E sentia vontade de chorar.
Passei a infância nisto – a apreciar os bons momentos e a lamentar que eles tivessem um fim.


Ana Braga

terça-feira, 14 de outubro de 2014

UM OLIVAL MÁGICO


Nesta região do Ribatejo, onde para percorrer qualquer distância temos de  galgar montes e vales, olivais e sobrais acompanham o nosso trajecto,  com as suas velhas árvores retorcidas e nodosas, cuja idade avançada lhes confere, não um ar frágil e debilitado, mas sim uma força e uma energia mais próprias da juventude.

Ora, não longe da Casa da Caldeira, a caminho do Outeiro da Cortiçada, existe um olival mágico. Quase à beira da estrada, entre uma curva e outra, não  passa despercebido aquele recanto, animado de curiosas esculturas, a quebrar a austeridade dos troncos e dos ramos das árvores, conferindo àquele espaço uma nota colorida e bem humorada. A curiosidade leva-nos, então, a fazer um pequeno desvio, para observarmos de perto esse cortejo animado de personagens esculpidas na madeira.

O seu autor, José Costa, é um artista autodidacta, cheio de sensibilidade e talento, oriundo de um pequeno lugar da freguesia. Bem cedo rumou a Lisboa, em busca de um modo de vida. Durante anos foi empregado de mesa numa conhecida cervejaria de Lisboa (quantas vezes me devo ter cruzado com ele nos idos anos 70?) apesar do corropio de servir copos e aturar clientes ainda lhe sobrava energia para responder ao apelo do seu impulso artístico, segundo ele, "um dom com que nasceu".

Sempre que podia, vinha até à sua aldeia e calcorreava os bosques, na mira de descobrir as raízes e os troncos que mais se adequavam às esculturas que tinha em mente. Com amor, persistência e um invulgar talento, foi dominando a arte de esculpir a madeira, dando-lhe a forma de gente, de animal manso ou feroz, de objecto inerte ou de planta viva. No exterior, tem as esculturas, segundo ele, de menor valor, apenas para animar quem passa, mas infelizmente com uma esperança de vida curta, visto estarem ali, à mercê do sol, do vento e da chuva. É enriquecedor e divertido fazer uma visita guiada com o autor, pois cada uma das suas obras e algumas delas, em conjunto, escondem um significado que só ele nos pode traduzir. De conhecidos politicos da nossa praça, muito expressivos, a figuras bíblicas ou tradicionais, temos ali de tudo.


Do outro lado da rua fica a sua casa, onde agora, depois de reformado, passa parte da semana. Convida-nos a entrar e é com um brilho nos olhos, que nos vai mostrando a sua oficina e explicando os seus projectos nas diversas fases em que se encontram. 

E por último, quando julgávamos que já estava tudo visto,  eis que nos espera uma sala, que ele abre, como quem nos revela um segredo bem guardado. Lá dentro estão as esculturas mais elaboradas e de madeiras de melhor qualidade. Ali estão expostas peças de arte sacra, divindades, pássaros de porte delicado, personagens da História e da Literatura, figuras simbólicas. A madeira polida é macia e foi trabalhada com delicadeza. É então que ficamos a saber que este artista tem participado em inúmeras exposições e é constantemente convidado a participar em mostras e certames por todo o país e também no estrangeiro. No entanto, o Sr. José Costa é uma pessoa modesta, simples, que gosta do que faz,  que encara o seu talento como a coisa mais natural do mundo e que se sente feliz por partilhar com os outros o resultado daquele dom com que nasceu. 




















quinta-feira, 3 de outubro de 2013

"Todo o trabalho parece leve a quem o não passa" (provérbio)



   
       




A chuva tomou-nos de assalto! De repente, sem avisar!
Trazia companhia a empurrá-la, um vento agreste, frio, nada amistoso, que devia estar preso em algum lugar remoto e que agora se soltou e vem esperneando como um cavalo selvagem.
O céu toldou-se e caiu sobre nós uma cortina opaca a encobrir a paisagem.

Para mim é sempre triste o regresso do Outono, sobretudo quando ele me entra assim pela porta dentro, sem aviso prévio. Confesso que não estava preparada e invadiu-me uma nostalgia do Verão que se foi, numa despedida “à francesa”.

Já tenho saudades do sol e do calor, das manhãs luminosas povoadas de bandos de pássaros chilreantes, das tardes em que procuramos as sombras das árvores, agora tão fustigadas pelo vento, ou do por do sol fulgurante, a pintar os montes de cores irreais.


A chuva é necessária e fazia falta, mas podia vir de mansinho, em doses
moderadas, sem fazer grandes estragos. Não falo só dos estragos que causa nos nossos estados de alma, esses tratam-se bem, com um chá quente, uma roupa mais aconchegante, uma boa leitura, uma companhia agradável…
O problema mais grave são os malefícios que tal mudança tão repentina pode causar, por exemplo à agricultura, uma questão pouco perceptível para aqueles que vivem na cidade, para quem a chuva é apenas uma grande maçada - porque ficam encharcados se saem à rua, sem guarda chuva, ou porque o trânsito pára, ou porque os bueiros entopem.

No campo, os prejuízos são diferentes. Os produtos que ainda estavam na horta, a amadurecer - como os tomates -,  ou as frutas nos pomares - como os figos -, perdem-se de vez. As nozes já colhidas e libertas das suas capas verdes, se não secam devidamente,  ficam com bolor, as uvas, que não foram ainda apanhadas, apodrecem nas cepas.

Na Casa da Caldeira, transformamos produtos hortícolas e frutas, fazendo compotas e patés de forma artesanal. O Outono é, por esse motivo, uma época de grande azáfama e de preocupações, relacionadas com o tempo atmosférico e com as “partidas” que ele nos pode pregar e, claro, com a qualidade dos produtos que preparamos.
Alguns dos produtos já foram confeccionados e devidamente embalados, como o doce de tomate, o tomate seco ao sol ou o paté de tomate. Mas muito há ainda por fazer. Os trabalhos não param e penso muitas vezes: “Será que as pessoas, quando pegam num frasco
de doce ou de paté, consultam o preço e ponderam se o hão-de levar ou não, imaginam todo o trabalho, amor e empenho que ali está encerrado?”

Aproveitamos para agradecer aqui a todos os nossos colaboradores que, por estes dias, talvez com saudades do Verão e de manhãs luminosas, dos bandos de pássaros e do por do sol fulgurante, se afadigaram, apanhando nozes e muita chuva à mistura, tomaram conta do fogão e do estado da fervura dos doces, contribuíram com as suas opiniões e se preocuparam em acautelar e preparar tudo para que possamos ter nas prateleiras os nossos produtos com a sua qualidade habitual.

Sem todos vós, Beatriz, Odete, Luís, Joaquim e Albertino, a Casa da Caldeira não seria o que é.







quarta-feira, 5 de junho de 2013

Aldeia Viva - um Fresco na adega


Aldeia Viva


Martin e Masha partiram. Deixaram a nossa casa, levando a pequena  Kettie Oktobrinka, agora mais crescida, mais independente e de cor mais rosada nas faces, um mês e vários dias depois de terem chegado.
Partiram em busca de espaço, do seu espaço de liberdade e de criação.

Seguiram o seu destino de artistas errantes, com os seus pequenos cadernos de cor acastanhada, que a todo o passo tiram da algibeira para esboçar um rosto, um pormenor do cenário, uma frase que desconheciam, o nome de um autor.
Levavam também um monte de bagagens, criteriosamente arrumadas em caixotes de bananas, por sua vez empilhados num carrinho artesanal por ele construído. Aquele carrinho, pintado de cores vivas, acompanha-os sempre, animando a sua itinerância.

Apesar do excesso de bagagem e do estorvo que isso pode causar a quem viaja de comboio, exibiam uma descontração absoluta, quer na atitude quer na sua peculiar maneira de vestir - a roupa ostentando ainda, marcas de tinta, restos de uma tarefa concluída, mas à qual parecem teimar em permanecer ligados.  Aquelas manchas multicolores a borrar a indumentária, prendem-nos a uma obra que deixaram para trás, depois de um mês de entrega absoluta. Arrastam consigo as marcas do trabalho. São trabalhadores, como diz Martin, num texto de trinta e tal páginas que nos deixou, onde disserta sobre o mural e a sua passagem pela Casa da Caldeira. 
Partiram ligeiros, como se levassem apenas uma mala leve e o meio de transporte fosse um carro próprio, que pudessem estacionar quando e onde lhes apetecesse.
Deixámo-los na estação de Santarém, no meio de gestos um pouco atabalhoados, despedidas emocionadas, com o comboio quase a entrar no cais.

Martin, ainda em nossa casa, parecia não querer separar-se da obra que nos deixou pintada na adega - havia sempre mais qualquer coisa a prendê-lo àquela superfície de parede, agora policromática e luminosa pela qual se apaixonou, quando ainda não passava de um espaço branco e deslavado, logo nos primeiros dias, e também noites, que ali esteve a ler e a meditar.
Os livros que descobriu na estante do pequeno apartamento contíguo à adega, onde ficaram instalados durante a sua estadia, tiveram o dom de o encantar e despertaram nele alguma inspiração meio adormecida. A tal ponto, que logo abandonaram o "modesto" projecto de passarem dois ou três dias a pintar telas, com os olhos cheios da belíssima paisagem que se ergue por trás da nossa casa: colinas arredondadas, competindo com encostas abruptas, por onde trepam, a custo, velhíssimas oliveiras e restos de mata mediterrânica, de arbustos rijos e espinhudos, a esconder fragas e tocas de bichos.
O trabalho foi árduo, com alguns acidentes pelo meio, e nós vimo-lo crescer, ansiosamente, satisfazendo, sempre que era preciso, alguns pedidos para compra de materiais (os pigmentos com que criaram as tintas, eram deles, assim como os pincéis e... a arte).

Agora, a obra está feita, Martin chamou-lhe Aldeia Viva e, perante ela, não temos palavras. Muitos dos elementos que a compõem têm um significado que conseguimos descodificar, conversámos muito sobre isso, e sabemos que se baseou em velhas histórias de família, aventuras e episódios romanescos, que lhes íamos contando, as relações sociais neste meio rural. O resto, foi a alma do artista que falou e só ele saberá.

Quanto a nós, sabemos que a adega nunca mais voltará a ser o que era - as pipas e as alfaias antigas, ali continuam, estáticas, na sua imobilidade de objectos em desuso, mas o Fresco veio dar-lhes vida. O Fresco é dinâmico, fala-nos de gente.

 Martin começou por  remover todo o reboco de cimento da parede, usando um martelo pneumático. 
 Em seguida, fez novo revestimento, à moda antiga, com areia, cal e outros materiais 
(restos de telhas e  tijolos moídos e agulhas de pinheiro - o pintor mexicano, Diego Rivera, por exemplo, 
usava pelos de cabra).

Martin trabalha numa a maquette, em cartão, fazendo aí os estudos para o futuro fresco,
enquanto Masha, sua preciosa colaboradora e crítica, faz fotografias do estado da obra.

Martin dividiu a parede em seis secções. Aqui, já se podem ver três secções pintadas.

 Martin no andaime, pintando e em pé, no chão, Oktobrinka
iniciando-se na pintura, com um pincel quase do seu tamanho.

O magnífico fresco já concluído, vendo-se a porta que dá para o apartamento,
ainda protegida por um plástico

sábado, 6 de abril de 2013


Os Viajantes



Nesta fase da vida, apetece-me estar no meu canto. Agrada-me uma certa rotina. Faz-me falta a minha ”zona de conforto”, como agora se diz, um lugar perto da janela, onde possa ler um livro, tomar o meu chá ou um bom copo de vinho e olhar de vez em quando através dos vidros, para observar as mutações do cenário ou as brincadeiras domésticas dos gatos e dos passarinhos.

Se o tempo deixar, saio, sento-me no quintal, vagueio pelos campos em redor, faço jardinagem, respiro o ar puro, aconchego-me à sombra das árvores. Fecho os olhos e deixo-me envolver no abraço revigorante dessa entidade suprema, que me transcende e da qual também faço parte – a Natureza, na sua multiplicidade de cores e de sons, dinâmica como um mar encapelado ou um céu por onde correm nuvens.

Noutros tempos, gostava de me aventurar por longínquas paragens. O desejo de evasão era mais forte e superava a ansiedade que me poderia assaltar, quando no outro prato da balança estivesse o bem-estar, a segurança ou a previsibilidade do meu dia-a-dia.

Talvez por me sentir actualmente, mais propensa ao sedentarismo, mais presa a hábitos e a espaços com os quais me identifico, me sinta fascinada, quando conheço alguém capaz de se lançar à aventura por esse mundo fora, disponível para viver a vida, tal como ela lhe surja ao virar da esquina, sem excessivas preocupações com o dia de amanhã- “free as a bird”.

Masha e Martin são como as aves – são jovens, descontraídos, sem ambições pretensiosas, criativos. E adaptam-se aos lugares que vão habitando. Curiosos, apreciam o que se esconde para lá do óbvio, procuram mergulhar na essência das coisas.

Estes novos amigos e a sua filhinha Kettie, vêm de longe e ficarão algum tempo entre nós, na Casa da Caldeira.  São artistas plásticos – ele alemão e ela ucraniana – transformaram a  adega no seu atelier temporário, um espaço de criação, onde além de desenhar e pintar, o Martin toca violino.

 Reconhecidos pelo acolhimento que lhes fizemos, irão decorar uma das paredes com um fresco alusivo à vida no campo. Será talvez um mural festivo, a lembrar o trabalho na terra, o dinamismo da vida rural, a alegria da preparação e da partilha da comida em torno de uma grande mesa, a celebração no fim de uma tarefa…

Tal como eles, o sol chegou, de surpresa. Entrou-nos em casa logo pela manhã e bateu nos vidros, como um viajante há demasiado tempo ausente deste poiso. Encheu de luz o meu canto atrás da janela e espalhou-se pelo jardim. Deu mais cor às flores, acordou os pássaros,  tornou os verdes mais brilhantes e alegrou-me a alma.

É tempo de sair e aventurar-me num passeio curto. No entanto, vou estar atenta a tudo o que me rodeia  - ver para além do óbvio.







quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013




       Momentos de uma tarde preguiçosa...

                                    a caminho da Primavera







































quarta-feira, 5 de setembro de 2012

OS VISITANTES


Na Casa da Caldeira temos o privilégio de receber, a maior parte das vezes,  pessoas que nos deixam gratas recordações - podem ser pequenos gestos, palavras simpáticas, um sorriso à despedida, que nos indica que gostaram da experiência e que um dia hão-de voltar. Tudo isso nos ajuda a melhorar a forma como recebemos aqueles que nos visitam, contribuindo, também, para minorar o nosso cansaço, levando-nos a sentir quase em férias, quando afinal quem está de férias são eles, os visitantes.

A passagem por aqui de muitas  pessoas, enriquece-nos de sobremaneira, pela oportunidade que temos de contactar  com diferentes personalidades e diversos modos de vida. Geralmente há sempre o interesse comum pela vida no campo, o amor à Natureza e a preocupação pela defesa do meio ambiente.
Mesmo aqueles que inicialmente se mostram menos atentos às questões ambientais, cremos que saem daqui mais despertos para esse tema, mais conscientes da necessidade de proteger a Natureza e de se alimentarem de forma mais saudável. Mas, muitas vezes, é quem chega que nos vem dizer algo de novo, que nos vem mostrar outros caminhos, outras formas de estar e de evoluir.

Num dos últimos fins de semana de Agosto fomos visitados por Pedro Martins e pela sua família. 
Pedro é fotógrafo da Natureza, assíduo colaborador da National Geographic e enquanto aqui esteve, munido do seu sofisticado equipamento fotográfico, não se cansou de caminhar pelas hortas e olivais, em busca de pequeninas coisas que, pela sua pequenez e fragilidade,  na maioria das vezes, escapam aos nossos olhos.
Não resisto a partilhar aqui as belas fotografias que ele captou por estas paragens.

Nota: A Libélula que aparece na imagem, de uma espécie muito rara, foi fotografada na Quinta da Ribaldeira, nossa propriedade. Dá pelo estranho nome de Calopteryx haemorrhoidalis e encontra-se geralmente em zonas onde existe água muito pura. Ficámos bem contentes por saber esta informação.